CURSO PARA ANIMADORES DOS ENCONTROS DE PAIS E PADRINHOS
Pastoral de batismo da Matriz de N. S. das Dores
Av. Paulo de Frontin, 500, Rio Comprido, Rio de Janeiro-RJ
Introdução:
O presente curso tem a finalidade de transmitir a experiência de uma equipe
que se mantém atuante nos últimos oito anos, promovendo muito mais um
intercâmbio com os participantes do que propriamente ensino. A apresentação das
conclusões desses oito anos ininterruptos de reflexão, investigação, pesquisa e
prática em mais de 70 encontros pode encurtar o caminho, ou mesmo encorajar os
que desejam participar dessa tarefa de evangelização e se sentem despreparados,
ou são tímidos. A seguir apresentaremos capítulos que constituirão elementos
para debates entre os animadores durante o curso. Esses capítulos procuram
paulatinamente descrever as condições necessárias e desejáveis para que o
futuro membro da equipe de batismo realize o trabalho com eficiência e
segurança.
CAPÍTULO
I: CONHECIMENTOS TEÓRICOS
Quando
iniciamos o trabalho nos sentimos impotentes face ao grande número de livros,
folhetos e formas de realizar o encontro. O conteúdo era sempre vasto e nós
nunca conseguíamos seguir toda aquela variedade. Eram três encontros: no
primeiro falava-se sobre sacramentos e sobre o Espírito Santo. O segundo sobre
Jesus Cristo e o terceiro sobre o cristão no mundo de hoje. No primeiro
encontro comentava-se também a cerimônia do batismo. Depois que vários membros
foram substituídos por outros, o volume de informações teóricas aumentou. A
quantidade de matéria aumentou ainda mais depois que participamos de vários
encontros a nível de região e de arquidiocese. Hoje achamos que o Evangelho é
suficiente como fonte de consulta, e como exemplo percorremos o evangelho de S.
Marcos, que pode ser lido totalmente em uma semana. Exemplificaremos com os
seguintes versículos: 1,21 – veio pregar e curar; 2,16 – veio salvar os
pecadores e escandalizou os escribas; 3,4-6 – Cristo não aceita a indiferença
às suas perguntas; 4,1-41 – Parábolas; 5,30 e 6,10 – cura e pregações; 7,18;
8,15; 8,27; 9,38; 10,5; 11,27-33 – com que autoridade fazes estas coisas? 12,1-37
– respostas aos fariseus; 13,11; 13,24.
Exercício:
Ler os outros evangelhos e procurar resumi-los como no exemplo acima. Uma
sugestão para realização deste exercício é ler o texto seguindo o critério:
a)
Reconhecer os versículos que são altamente decisivos para nossa conduta nos
dias de hoje. Geralmente esses trechos são irrefutáveis e claros, além de
provocar grande impacto quando se consideram os nossos hábitos criados na
sociedade em que vivemos. São receitas infalíveis para criação do Reino aqui na
terra, ou se alguém preferir, criar condições favoráveis para que a vontade de
Deus se realize no nosso ambiente, levando mais almas a alcançar o Reino.
b)
Identificar os versículos que são neutros, ou seja, não apresentam evidência de
poder influenciar a nossa conduta nos dias de hoje. Esses trechos são
geralmente de valor histórico e revelador dos desígnios futuros do Pai.
c)
Descobrir os versículos que são incompreensíveis ou confusos, pelo menos do
ponto de vista do leitor.
Essa
leitura deve ser feita com reflexão simultânea, de modo que a mente do leitor
se transporte a cada segundo, com imagens nítidas, para o ambiente onde se
realiza o encontro de Pais e Padrinhos.
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Nessas imagens ele se vê dialogando e
fazendo colocações constantemente com os circunstantes. Um trabalho mais
completo compreende a determinação das porcentagens de frases (palavras) que
constituem os itens a) b) e c) acima, para cada evangelho, em relação ao total
de palavras (linhas ou páginas) do respectivo evangelho. Esse trabalho, feito
em grupo, forneceria um dado interessante: mediria a homogeneidade do grupo
quanto à interpretação, ou o que também poderia ser a universalidade e
perfeição dos evangelhos.
Sendo
esse estudo básico e suficiente, voltamos a afirmar, o participante do curso já
pode se considerar apto para o trabalho. Mas com isso não estamos querendo
dizer que, consoante a disposição e carisma de cada um, não se deva prosseguir
no estudo de toda a Bíblia e de outros textos. Vamos parar por aqui para não
tornar esse capítulo cansativo pelo volume de informações, correndo o risco do
leitor perder a noção geral do encaminhamento do curso. Para suprir essa
deficiência, daremos referências de consultas bibliográficas, sempre que for
oportuno, ao longo dos outros capítulos.
CAPÍTULO II COMO INSERIR O EVANGELHO NA OCASIÃO DO ENCONTRO
Quando se
tenta inadvertidamente comunicar a mensagem evangélica através de fatos concretos,
que desembocam em exigências de mudança de conduta, advêm imediatamente
questionamentos do tipo: viemos aqui para ouvir falar do batismo!
Quando
é que vai falar do batismo? Acho que isso não tem nada a ver!
Em
épocas de menos experiência, ficamos chocados com esse tipo de manifestação dos
pais e padrinhos, sobretudo quando ocorreu pela primeira vez. Nessa primeira
vez conseguimos sobrepujar a situação graças ao nosso procedimento democrático,
principalmente tendo sempre em mente que é importante aprender algo dos outros
irmãos. Daí facultamos a palavra para encaminhamentos contra e a favor do que
se tinha colocado. O resultado foi que inúmeras pessoas defenderam o nosso
ponto de vista melhor do que nós mesmos poderíamos ter feito. Como os oponentes
puderam se manifestar à vontade, o clima final foi de desconcentração. Hoje em
dia iniciamos por suscitar perguntas sobre o batismo: Por que batizar? O que
significa batismo? A partir dessas colocações fazemos analogias com locais onde
o cidadão precisa fazer uma matrícula ou inscrição para em seguida pertencer
àquela organização, gozando de direitos e deveres. O batismo é uma marca que
deve diferenciar a pessoa, de modo a ser percebido nos meios onde ela convive.
A cerimônia em que se realiza o batismo é recheada de símbolos. Mas o símbolo
deve ter uma correspondência, do contrário torna-se vazio. O que difere a
pessoa após o batismo é o seu comportamento, que passa a ser o comportamento de
um cristão. Então o batismo inscreve a pessoa no grupo dos filhos de Deus,
serve para torná-la cristã. Nesse momento coloca-se a seguinte questão: onde
podemos aprender a ser cristão? Onde se encontram os ensinamentos ou regras que
devemos seguir para sermos cristãos? A essa altura sempre alguém responde que
não há outra maneira senão procurar conhecer o que Deus quer que façamos aqui
na terra, e a fonte é a Bíblia. Reforçamos a idéia de que devemos ser
diligentes e esforçados na assimilação dos ensinamentos evangélicos com a
seguinte analogia: tomemos como exemplo um aluno de educação física que
freqüenta uma aula dessa especialidade. Quando ele pratica todos os exercícios
necessários adquire músculos no peito e nos braços, as costas tornam-se de uma
largura exorbitante em relação a cintura e quadris, o abdômen parece permanecer
eternamente contraído quando comparado com o peito que estufa a camisa, a ponto
de não poder abotoá-la.Quando esse rapaz caminha pela rua, mesmo com movimentos
simples e trajes comuns, ninguém tem dúvida da profissão que ele abraçou.
Analogamente deve ser o cristão, as suas atitudes no dia a dia, no transporte
coletivo, na família, na sua opção de seguidor de Cristo. Feitas colocações
desse teor, pode-se passar ao exercício de reflexão evangélica, precedida de
uma apresentação introdutória da Bíblia. Nesse momento acrescenta-se que o
trabalho agora visa à busca do que os pais e padrinhos devem ensinar às
crianças para que elas sejam cristãs de fato, já que no momento elas não tem
condição de se manifestar (1), mas que terão já recebido a marca de cristão
quando estiverem fazendo uso da razão.
CAPÍTULO III: APRESENTAÇÃO DA BÍBLIA
Iniciamos
relatando que Deus no início se comunicava diretamente com a sua criação,
indicando o caminho a seguir para continuar em relação amorosa com Ele, sendo
semelhante a Ele e alcançando a felicidade completa. No início não havia nem
sequer a escrita, os ensinamentos eram passados de geração a geração, através
da linguagem falada. Naquele tempo os adultos, e especialmente os idosos, eram
figuras importantes no seio da comunidade. Os mais jovens ouviam com interesse
a história de seus antepassados, transmitida por aqueles anciões, verdadeiros
detentores da experiência e do saber. Com o surgimento da escrita essas
informações foram transcritas para a forma que hoje conhecemos. Nesse momento
pode-se dividir os participantes em grupos distintos, que dispostos em círculos
proporcionam ao animador a escolha do grupo para perguntas. Isso significa a
descontração para uma melhor participação, do que quando se dirigem perguntas a
todos em geral, ou à pessoa individualmente. Se possível, os grupos devem ter
denominações diferentes, por exemplo: depois de uma breve exposição sobre
Trindade, nomeia-se o grupo das mães de grupo do Espírito Santo, o grupo dos
pais de grupo do Pai e o grupo dos padrinhos e madrinhas de grupo do Filho.
Deve-se tomar cuidado para que os grupos tenham aproximadamente o mesmo número
de integrantes, transferindo-se, por exemplo, as madrinhas, as mães ou pais
mais jovens, para o grupo do Filho, pois tem acontecido ser esse o grupo
inicialmente mais reduzido. À medida que se avança na exposição da Bíblia,
dirigem-se perguntas constantemente aos grupos, aproveitando-se para saber o
nome das pessoas, encorajando o debate entre pessoas de grupos diferentes,
estimulando o cochicho dentro do grupo para discussão da pergunta, e para
obtenção da resposta mais pertinente. Essa composição de grupos tem a vantagem
de proporcionar um maior entrosamento e comunicação entre pessoas, uma vez que
madrinhas, mães, pais, padrinhos, e freqüentemente, amigos e parentes dos
presentes, relativos a crianças diferentes, estarão sentados lado a lado, sem a
intervenção do animador. Uma idéia é também escrever no quadro de giz o nome de
cada pessoa que responde a uma pergunta ou demonstra uma iniciativa de
participação, contribuindo para um maior incentivo à participação, e tendo a
função auxiliar de arquivo momentâneo, no caso de haver um lapso de memória ao
se ter que se dirigir a mesma pessoa pelo nome. No caso, nós aproveitamos esses
recursos simultaneamente com colocações tais como: uma reunião de cristãos se
caracteriza pela franqueza, confiança mútua, doação, descontração, de modo que
sabemos quando o ambiente está atingindo o ponto ideal de trabalhabilidade.
Percebe-se isso pela espontaneidade, pela alegria, pelas colocações refletidas
e produtivas, pela descontração no tratamento recíproco (nós costumamos chamar
os idosos pelo primeiro nome e pelo pronome você), pela naturalidade do
tratamento da realidade (sem as conotações “não se deve falar mal dos outros”,
sem confundir discrição com omissão, etc.).
Certa
vez uma senhora estava resmungando e com aparente mau humor. Perguntamos de que
se tratava e ela respondeu que achava um absurdo uma pessoa vir para a igreja e
ficar numa sala até àquela hora, e em jejum. Então respondemos que na próxima
reunião iríamos providenciar um cafezinho com biscoitos, o que até hoje vem
acontecendo, e que era procedente a reclamação dela. No momento, talvez dado ao
nosso sincero acatamento, o ambiente na sala se tornou receptivo, inclusive da
parte desta senhora. Outra vez, recentemente, uma senhora se encontrava
casmurra e sem nenhuma participação, apesar da nossa insistência. Num dado
momento, pedimos que ela partilhasse os motivos de sua tristeza. Ela então
contou que tinha deixado um filho doente em casa. Logo depois o semblante dela
se modificou devido ao alívio causado pelo acolhimento compreensivo dos
presentes e do nosso pedido a Deus para olhar para o sofrimento daquela
família. Esses exemplos servem para mostrar que não é possível obter 100% de
participação, por estas e outras razões.
Seguindo
o roteiro perguntamos quantas partes distintas contém a Bíblia. Qual a divisão
mais importante da Bíblia, que coincide com a chegada de Jesus Cristo a terra?
Quanto tempo já decorreu depois disso? Quanto tempo antes disso, já se tinha
notícia das alianças de Deus com os homens? Quanto tempo necessitaria uma
pessoa, para ler a Bíblia, da primeira a última página? Nesse estágio muitos
participantes já têm respondido que o Antigo e o Novo Testamento são partes
importantes e nós informamos que levamos aproximadamente 03 meses para ler toda
a Bíblia. Pedimos que todos os
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grupos respondam de quantas
páginas são constituídos o Antigo e o Novo Testamento (temos cerca de 13
Bíblias para distribuir entre os grupos). Pedimos também a todos os que têm a
Bíblia na mão que mostrem os respectivos volumes de páginas correspondentes aos
dois Testamentos. Qual a razão da existência do Antigo e Novo Testamento? Que
disse Jesus a esse respeito? Comentamos que o homem, na sua origem, não era
ainda completamente desenvolvido, e que Deus, como seu criador, sabia muito bem
disso. Por isso ele acompanhava adequadamente as etapas do seu desenvolvimento,
até o ponto em que se fez necessário o envio de seu próprio Filho. Esse Filho
inaugurou uma nova ordem de estatutos e justificou: “Não vim alterar a lei dos
profetas, mas vos dou um novo mandamento. Naquela época era assim por causa da
dureza dos vossos corações...”. Perguntamos qual a principal divisão do Novo
Testamento. Enfatizamos que os evangelhos são fundamentais para orientação da
vida dos cristãos. O resto do Novo Testamento, a partir dos Atos dos Apóstolos,
é a vida dos primeiros cristãos e da sucessão dos seguidores de Cristo, que poderia
continuar até os nossos dias. Exemplificamos como seria maravilhoso, se hoje em
dia, os cristãos escrevessem cartas (epístolas) aos seus irmãos em Cristo,
mostrando as suas preocupações, zelando pelo anúncio do Reino, exortando-os a
uma ação mais coerente e concreta, promovendo a aproximação e união de
paróquias longínquas, partilhando sugestões e contribuições. O Evangelho é a
parte mais importante porque dita o procedimento necessário para que se tenha
parte com Cristo. É o ensino direto e objetivo do Filho durante o tempo que
passou entre os homens, com essa finalidade. Fazemos a analogia de um técnico
em agricultura, que visitando uma família amiga na zona rural, faz amigos
também na vizinhança. Durante o tempo em que esteve ali de férias, realizou
algumas plantações, técnicas de adubagem, de irrigação e drenagem, sempre em
companhia desse pequeno grupo de amigos. Nada, porém escreveu sobre essas
técnicas e procedimentos. Um número menor ainda de amigos, conscientes da
importância daqueles ensinamentos, acompanhou muito atento a tudo que se
passava, e logo depois da partida do mestre, cada um desses amigos continuou a
executar aqueles procedimentos e a propagá-los, para que todos os seus
descendentes e todos que deles precisassem os recebessem gratuitamente, pois
reconheciam que os tinham recebido sem nenhum ônus. Chegaram finalmente à
conclusão, entre eles já alguns discípulos dos amigos do mestre, que a melhor
solução seria resumir em forma escrita todo o essencial, de modo que todos que
quisessem usufruir dos bons resultados daqueles métodos não tivessem a menor
dúvida de como proceder, assim como não tivessem necessidade de esperar até que
alguém lhes aparecesse para ensinar, ou que inescrupulosos tirassem proveito do
conhecimento dessas técnicas.
Quantos
são os evangelhos? Quais são os nomes das pessoas que os escreveu? Quanto tempo
levaria um indivíduo para ler um evangelho? Pedimos nesse momento que abram as
Bíblias e segurem-nas para o alto, prendendo entre os dedos os evangelhos, para
que todos tenham uma nítida idéia da proporção entre os números de páginas dos
evangelhos, do número de páginas do Antigo Testamento e do número de páginas do
testamento dos primeiros cristãos. Perguntamos como são divididos didaticamente
cada evangelho, assim como todos os outros livros da Bíblia. Perguntamos nesse
momento se alguém sabe como são divididas as novelas apresentadas na TV, para
facilitar o acompanhamento por parte dos telespectadores. Depois de alguns vai
e vem todos descobrem os capítulos e versículos. Pedimos que todos se ajudem
mutuamente. Principalmente aqueles que têm dificuldade com a leitura. Quantos
capítulos têm o evangelho de São Marcos? E o de Mateus? Quantos versículos têm
o capítulo 20 de Lucas? A essa altura já começam a acontecer coisas
surpreendentes: pessoas que vinham participando, e em posição de destaque,
confessam que conheciam os capítulos, mas não sabiam dos versículos, a sala se
enche de animação e vitalidade, nós repetimos sempre que todos podem “colar”
para obter a resposta certa. Com mais alguns poucos retoques, como sejam: o
evangelho nos indica que devemos fazer a reflexão de preferência em comunidade
(onde há dois ou mais reunidos em Meu nome...). Reforçamos que os evangelhos
são por demais lógicos, assim quis o Criador, de modo que não pode haver
cristianismo sem o encontro das pessoas. Por isso ninguém tem o direito de se
recusar a participar de um encontro batismal, especialmente os que têm intensa
participação eclesial, pois a sua falta irá fatalmente empobrecer de certo grau
o ambiente, uma vez que ele tem o dever de doar o seu conhecimento a aqueles
que procuram o batismo. Sempre denominamos a nossa reunião de “Encontro”, e
não, “Palestra ou Curso”. A razão é que a palestra tende a ser entendida como
alguém, que sabe, vai ensinar a uma platéia de assistentes que não sabe,
enquanto que
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o encontro compreende o diálogo de pessoas que sabem coisas
diferentes, mas que estão dispostas a explicitar tudo que sabem, generosa e
alegremente, para que os demais usufruam deste acervo, ao mesmo tempo em que
estão atentas a aprender cada vez mais (possivelmente reformular alguns dos
seus conhecimentos) mediante completa reflexão do que os outros manifestaram.
Exortamos
os presentes para que se mantenham em silêncio quando um irmão estiver expondo
o seu ponto de vista, e, quando falarem, procurar dizer muito com poucas
palavras, ou a estarem sempre lembrados de que o tempo certamente será pouco
para que todos falem abundantemente, mas que seria em última análise desejável
um tempo maior para o nosso encontro. Depois de terem manipulado bastante a
Bíblia, as pessoas estão aptas a fazer as consultas para a reflexão evangélica.
A escolha dos capítulos pode ser feita livremente pelos grupos, no caso de não
se ter uma melhor opção. No nosso caso temos deixado aos grupos a indicação do
evangelho, capítulo e versículo, como experiência aleatória, alertando sempre
para o que poderá ocorrer (ver capítulo1, itens a, b e c). Surpreendentemente
tem ocorrido que as leituras são interessantes e se enquadram no assunto que
estamos tratando, mesmo quando escolhidas por indivíduos sem prática de leitura
bíblica. Encorajamos também a leitura de livros que mostram a reflexão de
outros cristãos durante a leitura do evangelho (2). No final, um representante
de cada grupo faz a leitura e resume as reflexões do grupo, além de ser aberta
a qualquer outro componente dos grupos a palavra para comentários.
CAPÍTULO IV: INSERÇÃO DO ANIMADOR NA REALIDADE PAROQUIAL
As
condições ideais para ocorrência de um batismo em Cristo, numa paróquia típica
de uma grande metrópole, ainda dependerá muito do esforço conjunto de uma
significativa parcela de leigos que a freqüentam. Por isso o animador deve
estar consciente de que ele está em meio a uma caminhada, o que é diferente de
se já ter os paroquianos razoavelmente organizados e orientados para virem a
ser uma comunidade. Podemos concluir então que esses capítulos foram escritos
em função de sua utilidade no momento atual e muito menos como algo que
funcionaria dentro de quaisquer outras situações, que esperamos venha a surgir
em futuro próximo. Os capítulos I, II e III poderiam deixar de ter relevância,
se alguns parâmetros fossem mudados, se outras situações estivessem ocorrendo
dentro da realidade paroquial. Tomemos por exemplo as inscrições com
preenchimento de fichas, onde geralmente constam o nome da criança, dos pais e
padrinhos, endereços, credo, data do batismo, paróquia onde será realizada a
cerimônia, hábitos religiosos dos pais e padrinhos etc. Apesar da maioria das informações
ser prestada com honestidade, pois é comum ter-se reuniões mensais com muitas
fichas demonstrando absoluta falta de conhecimentos evangélicos, não há um
esforço para reparação dessa falha antes do dia do encontro. Essas inscrições
são feitas normalmente por uma mesma pessoa, que funciona como secretária da
paróquia e tem simultaneamente todos os outros afazeres relativos ao
secretariado, ao invés de se ter uma co-responsabilidade de um número maior de
elementos da comunidade, que aproveitaria essa oportunidade para ajudar aos que
procuram o caminho, a verdade e a vida.
A
tradição bíblica mostra que primeiro evangeliza-se, e depois, quando o
batizando refletiu suficientemente sobre os direitos, deveres e riscos que
trarão a sua nova condição, inclusive já com alguma prática na vida real, ele
faz a sua opção. Essa opção é reconhecida pela comunidade local, onde o
batizando será inserido. O padrinho iniciou o candidato nos ensinamentos
bíblicos, exercitou-o, e continuará responsável pelo seu desenvolvimento junto
à comunidade. Nos parece muito lógico (como é o Evangelho, assim quis o
criador) que algo muito bom precisa ser divulgado, mas não imposto sem uma
justificativa convincente, muito mais ainda por tirar a oportunidade do
batizando de se inscrever corretamente. Achamos que pais evangelizados,
inscritos numa comunidade autêntica, jamais insistirão no batismo de suas
crianças (4). Pelo contrário, aguardarão o dia em que seus filhos vierem a
decidir este passo, cheios de esperança e alegria. Por esta razão se dedicaram
anos a fio a mostrar o valor dessa coisa tão boa (Mt 13, 44-45), praticando
tudo que estava ao alcance deles, com relação à comunidade e ao resto da
sociedade. Podemos mostrar também que o batismo de crianças tem uma
justificativa social, e, portanto só podendo ter sido utilizado enquanto
perdurassem aquelas condições
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sociais, que reconhecemos hoje não terem sido
justas. No tempo da sociedade patriarcal batizava-se a família do patriarca
porque a família não podia ter vontade própria. O pai decidia com quem a filha
ia se casar ou qual das filhas iria casar primeiro, qual dos filhos iria
estudar etc. Embora isso tenha ocorrido na Europa por toda a Idade Média, ainda
é bem recente em muitos locais do nosso País. Por coincidência, tivemos no
mesmo dia da redação dessa página, um relato de uma amiga nossa, ministra da
eucaristia e zeladora do altar de uma de nossas paróquias. Um de seus bisavós,
na época dono de escravos no Nordeste, era tão rigoroso que fez um escravo
comer 01 litro de sal por ter achado a comida insossa. Mas não era diferente
com relação a outros aspectos, pois conta-se que sua filha pressionava uma
espécie de bandeja contra a barriga, por meio de amarras, para esconder uma
gravidez fora do casamento, e que, na dispensa de sua casa, ela colocou o
pescoço da criança em baixo da borda de um enorme tacho de ferro, sufocando-o.
Tudo por temor à autoridade do pai.
Mesmo
admitindo o batismo de crianças, os mesmos argumentos são válidos para o caso
dos pais e padrinhos, uma vez que eles trazem a criança sem saber o que se deve
fazer para ser um cristão. Ora, como se pressupõe que a criança será orientada
por eles, deveria haver uma preocupação no sentido da integração dessas pessoas
na comunidade, e de sua evangelização. Se considerarmos, por exemplo, as
“Testemunhas de Jeová”, em sua maioria absoluta, favelados e operários, vemos
que eles visitam residências constantemente, em grupos de 02 ou 03 elementos,
visando a divulgação de sua doutrina. Eles se prontificam a voltar àquelas residências
para iniciar o morador no estudo da Bíblia, tantas vezes quantas forem
necessárias. Todos pertencem a uma dada comunidade, onde estudam a Bíblia 03
vezes por semana. De 03 em 03 meses fazem uma prova escrita geral sobre as Escrituras
Sagradas. Se compararmos à nossa paróquia, vemos que em 03 ou 04 missas
dominicais podem-se reunir cerca de 1.000 pessoas. Verificando-se as reuniões
de alguns grupos paroquiais, observa-se o nível econômico pela quantidade e
qualidade dos automóveis ali estacionados. A opulência do templo e a área
adjacente ocupada, de invejável amplidão para aquele distrito, são patrimônios
de incalculável potencial de utilização para fins de evangelização. Face a essa
pequena exposição, podemos considerar que aplicando-se um coeficiente de
segurança de 02, contar-se-iam com 500 cristãos dispostos a se revezarem, de
modo a haver sempre um grupo pronto para ajudar a um casal de pais ou
padrinhos, na sua intenção de tornar uma criança um futuro seguidor de Cristo
(Mt 10, 32-40). Contrastando com essa hipótese, nos oito anos de trabalho não
tivemos mais do que cerca de meia dúzia de pessoas aptas a desenvolver esse
tipo de trabalho. Numa conversa confidencial com uma de nossas amigas, veterana
regente de coro de uma de nossas paróquias e assídua na hora da comunhão
dominical, ela confessou nunca ter lido um evangelho.
Uma parte
do dízimo que individualmente devemos doar para a causa do Senhor (mais ou
menos 10%, quando o Senhor tem direito a tudo quanto existe) daria para
distribuir dezenas de Bíblias a cada família nos encontros batismais, inclusive
transporte e lanche (Lc 9,12-13), e ainda sobraria uma fortuna para tudo o
mais. Porém a falta de uma administração cristalina, participativa,
transparente e democrática, impede que essa soma chegue aos locais onde se faz
necessária. A hierarquia dominante prefere receber um centésimo dessa soma, sem
ter que prestar contas a ninguém do que o total com a co-gestão da comunidade
((28), págs. 23, 25, 41, 46, 51, 52).
A
cerimônia do batismo em cada paróquia ocorre à revelia da comunidade. Em certas
paróquias, a missa é encerrada apressadamente para que haja tempo dos
assistentes saírem, de modo que os que vão assistir ao batizado das crianças
entrem, em quase sua totalidade desconhecidos da comunidade e do próprio padre.
Isso contraria completamente o sentido do batismo e o sentido de comunidade.
Para não alongar mais esse capítulo, concluímos informando ao futuro animador,
que ele deve estar perfeitamente consciente de que “vai fazer”, junto com meia
dúzia de membros, em apenas um único encontro de 3 horas, tudo o que deveria
ser feito por uma comunidade de 500 pessoas, crente e estudiosa, numa cadência
adequada (Jo 15,12-17).
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CAPÍTULO VI: INSERÇÃO DO ANIMADOR
NA REALIDADE ECLESIAL
Jesus
Cristo instituiu a sua igreja (Jo 21,15-17) (Lc 9, 1-6) (Mt 16, 18-19), dando
poder a Pedro para liderá-la e instruindo a tantos outros discípulos sobre o
que deveriam fazer. Pedro passou a ser o ponto de união da Igreja, sendo sucedido
pelos papas até os nossos dias. Dessa forma percebemos o grande amor de Deus,
pois sabendo que as suas criaturas eram de carne e osso, e, portanto passivas
de certas limitações, cuidou para que seu rebanho tivesse um ponto visível de
unidade e organização. Os sinais, que são os sacramentos, servem para
demonstrar concretamente as ligações de Deus, porém não mais em sua forma
encarnada, com o seu rebanho aqui na terra. Esses atributos são de
exclusividade de sua Igreja, elemento de ligação entre a humanidade e o seu
criador. Como os elementos a quem Cristo delegou o poder de ligar e desligar,
de ter a posse da chave do céu, etc., jamais contrariaram as prescrições
recomendadas pelo mestre, podemos concluir que essas pessoas eram apenas
instrumentos para a realização da vontade do criador. Inclusive pode-se
confirmar também esse ponto de vista pelas conseqüências a que chegaram esses
seguidores: morte cruenta pela fidelidade ao Evangelho (Lc 16,17) (Mt 24,35)
(Jo 21,18-19). Por essa conclusão lógica, não poderá jamais haver uma Igreja na
face da terra que tenha o poder de contradizer um só versículo do Evangelho,
que não propague e pratique por todos os recônditos tudo o que está escrito,
que não acolha todo aquele que lhe reclamar o cumprimento da lei. Neste ponto
podemos tirar uma das conclusões práticas mais importantes desse
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estudo, a de
que devemos conhecer tudo o que está escrito, decidir se vamos começar a
praticar essas recomendações, para ativamente exigir a devida coerência das
igrejas em nossa volta.
Durante
os primeiros três séculos de existência, a Igreja era nitidamente evangélica e,
portanto coerente com a sua finalidade, mas na Idade Média enfrentou diversas
dificuldades. A Idade Média corresponde à chamada época “negra” da humanidade e
corresponde aproximadamente há 1.000 anos, descontando-se 500 anos da data
atual e somando-se 500 anos a data do nascimento de Cristo, pois são decorridos
cerca de 2.000 anos do nascimento dele. Hoje em dia, Teólogos e autoridades
eclesiais declaram que a Igreja é santa e pecadora, por ser constituída por
pessoas humanas, como o foi Pedro, que negou Cristo por 03 vezes. Pode-se
também diferentemente afirmar que a Igreja (Mt 8,21) (Lc 11,27-28) (Lc 9,49-50;
11,23) é santa e não pecadora, partindo-se do princípio de que ela só pode
ligar e desligar em consonância com o Evangelho, de modo que não deveria haver
lugar para decisões sem a consulta aberta e democrática do Evangelho (Jo
5,22-23; 7,24) (Lc 12,14). Com relação a esta consulta democrática devemos
esclarecer que certas autoridades eclesiais interpretam esse conceito de forma
inversa; declara enfaticamente que a Igreja não é absolutamente uma instituição
democrática, com a intenção de justificar decisões arbitrárias e de inibir
qualquer iniciativa de exigência de prestação de contas por parte de alguma
instância hierarquicamente inferior (Mt 18,15-18) (Lc 17,3). Essa atitude
impede o surgimento do ambiente de amor favorável à prática do Evangelho, e
curiosamente provoca o efeito inverso que o desejado pela hierarquia superior,
qual seja o de tranqüilidade face ao domínio completo da situação. É tal a
intranqüilidade, que enorme sofrimento é causado a essas pessoas, pois tendem a
se afastar do colóquio do rebanho como mecanismo de defesa, pois não sabem como
carregar um fardo tão pesado (M 11,28-30). Eles poderiam afirmar, nesse caso
com plena correção, que a Igreja não é de fato, uma instituição democrática e
sim, teocrática, mas por um outro motivo: numa democracia os cidadãos tudo
podem dentro das regras, inclusive reformular a sua constituição, desde que
aplique os procedimentos democráticos do voto, enquanto que essa mesma
prerrogativa não existe na sociedade que prepara o Reino de Deus, pois ela é
regida por uma constituição que é maior do que o próprio céu (25, pág. 45). Por
outro lado, muitos procedimentos democráticos só viriam a favorecer o
desenvolvimento das comunidades, podendo-se mostrar que eles são até mesmo
evangélicos. Entre esses incluem-se a prática de assembléias, eleições de
bispos, cardeais, párocos, conselhos paroquiais etc, ou seja, as que facilitam
ao máximo a influência do rebanho, deste que não altere a constituição. A prova
de que existe contradição nessas manifestações da hierarquia superior é que a
eleição secreta entre os cardeais, para eleição do papa, é praticada e tem sido
um procedimento democrático ideal para essa situação. Outro ponto importante é
a restrição que se impõe às mulheres, sem que haja uma justificativa competente
para excluí-las de participação na hierarquia superior.
Achamos
que essas práticas nos fariam como que induzidos a uma necessidade constante de
consulta aos Evangelhos para argumentações no seio da Igreja, e quanto mais
tivéssemos necessidade dessas consultas, assim como também ambiente propício a
essas argumentações, mais Ele seria prática e vida. A nossa prática de 8 anos
tem mostrado esses resultados, uma vez que a nossa referência tem sido os
Evangelhos. Se fizermos a leitura histórica da atuação da hierarquia superior
no Brasil, veremos que a prática foi exatamente a inversa, pois os padres
sempre proibiram a leitura da Bíblia Sagrada aos fiéis, sob a argumentação de
que poderia haver má interpretação das Escrituras Sagradas. Argumentos
semelhantes existem também do ponto de vista geral como o de que muita gente
dando opinião gera confusão, perda de tempo, indisciplina, impossibilidade de
se chegar a uma decisão etc.
A
nossa experiência não tem levado a esse tipo de conclusão. Em outros trabalhos
simultâneos, em outras paróquias, como por exemplo, o nosso trabalho de pouco
mais de um ano recuperando uma biblioteca paroquial, mostra bem esse aspecto.
Nesse trabalho convocamos todos os paroquianos para gerir uma biblioteca, com
igual conhecimento de causa. Nas reuniões abertas houve sempre pouco comparecimento,
o que mostra o oposto aos temores explicitados acima. Achamos até natural que
isso ocorra, pois quando se tem todo o direito de dar opiniões têm-se também
todos os deveres e responsabilidades. Apesar de não termos como pressionar, nem
poder hierárquico sobre as pessoas, tivemos cerca de 30 pessoas que trabalharam
naquele ano. Como resultado tivemos todos os livros encapados e catalogados em
prateleiras novas, além de algumas promoções culturais. As doações em dinheiro
eram rigorosamente registradas e aplicadas, com prestação de contas pública e
detalhada. Os
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detalhes em quadros no interior da biblioteca, onde constavam a
quantidade de parafusos, buchas, tábuas, etc., e os locais onde tinham sido
aplicados. A idéia era de se ter os principais jornais e revistas para leitura
grátis na biblioteca, programação de leituras e discussões conjuntas de
encíclicas pontifícias, livros e artigos de interesse, tudo decidido
democraticamente. Previa-se que o encontro de cristãos seria facilitado, além
do exercício da reflexão, comunicação e conscientização. Outras atividades
também teriam lugar, como feira de livros e uma proposta de futura discoteca
para músicas sacras. Ao se aproximar o mês de dezembro, inúmeros paroquianos
tinham prometido contribuir um pouco mais com o13o salário,
mas era também o mês de N. S. da Imaculada Conceição, e o padre tinha comprado
uma imagem para ser paga pela comunidade. Muitos vieram se desculpar por não
ter mais disponível o dinheiro que iam destinar à biblioteca. Nós respondemos
que podíamos esperar, porque a biblioteca ia estar sempre ali. Construímos o
primeiro quadro luminoso para exposição do primeiro livro, que seria vendido na
biblioteca com a finalidade de ser lido e discutido pela comunidade. O dia da
mesa redonda seria marcado antecipadamente, para que todos tivessem tempo de
fazer a leitura. No dia em que estávamos prontos para afixar o quadro na parede
externa da biblioteca, por onde todos passam após as missas dominicais, o padre
nos abordou e disse: “Tirem isso daqui para depois não me chamarem de bruto”.
Compreendemos
naquele momento que, por mais humilde que fosse, por mais paciente, por mais
resignado, não havia quem pudesse fazer alguma coisa naquele ambiente. Dias
depois os livros e utensílios da biblioteca simplesmente desapareceram e surgiu
em seu lugar uma mesinha com a imagem de Nossa Senhora. O nome da biblioteca
foi retirado da fachada do prédio. O jornal paroquial também deixou de
circular. Nesse mesmo ano as reuniões da Campanha da Fraternidade deixaram de
ocorrer quando no salão paroquial, numa reunião exemplar, com todos sentados
num grande círculo, houve necessidade de que perguntássemos se o dinheiro do
aluguel do estacionamento, correspondente a um carro no pátio da igreja, podia
se destinar á compra da tinta para o mimeógrafo que imprimia o jornal
paroquial. O padre respondeu que não. Perguntamos por quê. Ele disse que haviam
outras prioridades. Então perguntamos quem decidia sobre as prioridades, e ele
respondeu enfaticamente: “Eu”.
Se
refletirmos um pouco sobre esses fatos reais podemos imaginar diversas hipóteses,
cheias de incertezas e especulações: teria o bispo obrigado o padre a fazer
isso? Teria ele sido forçado por outras circunstâncias? Quem lucrou com o
ocorrido? Foi justo? Será que....? Concluímos se é justo e evangélico que uma
comunidade seja tratada como uma escrava, sem poder dialogar, sem ter
participação e sem saber o que realmente está acontecendo (Lc 12,2-3) (Jo
15,15). Por outro lado, se a prática fosse de decisões desse tipo ser tomadas em
assembléias, levando-se em conta necessariamente que não faltassem ao padre
todas as condições de sacerdote (despojamento das coisas materiais, desejo de
servir, etc.), o próprio padre estaria sempre protegido de inserções indevidas
na vida da comunidade, já que todos teriam inevitavelmente que tomar
conhecimento das decisões (26, pág. 82)
Uma
outra experiência que ocorreu conosco, em outras circunstâncias da vida
paroquial, foi a visita pastoral do bispo à nossa paróquia. Esse bispo promoveu
dinâmicas de grupo entre casais de paróquias diferentes, e que eram
representantes das paróquias que compunham a região em questão. Ele fez
combinações de grupos, que eram modificadas cada semana, de modo que
praticamente cada casal pôde conhecer um pouco da vida de todas as outras
paróquias. O resultado foi assombroso, descobriu-se uma variedade imensa de
procedimentos para a mesma atividade pastoral, insatisfações de todos os tipos,
e que apesar da proximidade geográfica das igrejas, era inteiramente
desconhecido o que se passava nas outras paróquias. Foi tal o sucesso, a
freqüência e a participação, que o bispo sugeriu a formação de uma equipe
inter-paroquial a nível de região, para tornar permanente esse tipo de
integração. Quando ele finalmente pediu que levantassem o braço os que
quisessem fazer parte, não faltaram voluntários.
Algum
tempo depois, soubemos que esse bispo tinha sido transferido para outra diocese
distante 1.000 km, e apesar de termos dado endereço e telefone, nunca mais
fomos contactados para integrar a equipe que serviria à região.
Nossa
paróquia teria sido certamente muito beneficiada com esse tipo de intercâmbio.
Como exemplo podemos nos referir à nossa pastoral de batismo na atual paróquia.
Ela realizava 03 encontros
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de pais e padrinhos para se poder batizar uma
criança. Acontece que as paróquias vizinhas realizavam apenas um encontro, além
de haver paróquias que facilitavam ainda mais. Tivemos então que baixar o nível
do nosso trabalho para poder concorrer com aquelas paróquias, pois se tivéssemos
continuado com 03 encontros a nossa paróquia estaria batizando 01 a 02 crianças por mês,
enquanto que as outras batizariam centenas.
Uma outra
experiência que nos mostrou a realidade eclesial foi a nossa participação como
membros de uma equipe de pastoral de batismo a nível de vicariato. Nós éramos
coordenadores de uma região, da qual fazia parte a nossa paróquia. Conseguimos
realizar dois encontros entre as paróquias de nossa região e participar,
durante aproximadamente 01 ano, das reuniões presididas pelo coordenador do
vicariato. Essas últimas reuniões eram extremamente vazias, pois nunca viemos a
conhecer o padre responsável pela pastoral, e, além do casal que presidia a
reunião, havia mais uma dezena de pessoas, que seriam os casais que representavam
as diversas regiões. Isso porque, além de alguns sempre faltarem, acontecia com
freqüência só vir um dos cônjuges. Mas nas reuniões entre as paróquias de nossa
região conseguimos algum resultado, logo neutralizado pela oposição ou
indiferença de quase todos os párocos da nossa região. Mais uma vez sentimos
que não havia possibilidade de motivarmos a massa de fiéis, dominada e
emudecida pelos respectivos párocos, sem ambiente propício à comunicação, como
tal é o ambiente nas paróquias, mesmo para tão nobre e santa tarefa. Os padres
não compareceram aos dois encontros, com exceção do nosso pároco. A maioria não
conseguiu sequer achar um coordenador para a pastoral na sua paróquia, e muito
menos formar uma equipe. Um desses párocos, ao ser procurado para divulgação do
encontro, explicou suas idéias da seguinte maneira: tomou a nossa mão,
apontando para as alianças, e disse: A reunião é com padres. Para tratar desses
assuntos só reunião de padres. O lugar de casal é em casa. O casal pode ajudar
na paróquia, eventualmente, mas reunir para tratar de assuntos da Igreja é com
os padres. Resta assinalar que esse pároco era extremamente dominador na
organização das atividades da sua paróquia. Assistimos a uma palestra para pais
e padrinhos, nessa paróquia, e constatamos que a equipe da pastoral de batismo
era nada mais que a justaposição de pessoas que proferiam a palestra no dia em
que eram incumbidas pelo coordenador. A palestra era semelhante à homilia das
missas de domingo, em que a avantajada platéia (em relação à nossa paróquia)
ouvia sonolenta, pois foi à noite a que presenciamos.
Para
não estender mais esse capítulo, vamos interromper aqui a narração de uma série
de fatos reais, os quais nos mostram a necessidade de formação de novos
hábitos, para que não seja obstado o desenvolvimento do Reino. Aliás, esses
párocos não são mais do que o resultado dos hábitos desenvolvidos nos
seminários, num ambiente de opressão e desamor.
O
animador poderá ver que terá pouca possibilidade de interferir na vida da
paróquia, mesmo que seja em benefício da pastoral do batismo. O que explica o
comportamento eclesial com relação aos dois últimos exemplos, é que é mais
fácil dominar, ou agir arbitrariamente (talvez a única maneira), é quando se
suprimem as informações (8).
CAPÍTULO VII: O ENCONTRO DE BATISMO E AS IDEOLOGIAS
Apesar de
não se poder abordar todo esse vasto assunto, tentaremos focalizar alguns
pouquíssimos aspectos, pois evitá-lo seria imperdoável. Sua importância se
refere à necessidade que tem o animador de poder se situar face a uma
inesperada colocação por parte dos encontristas, sendo muito natural que as
pessoas tenham as suas preocupações. Mesmo que isto não ocorra explicitamente,
é de se prever que tal curiosidade permeie as mentes.
A
nossa experiência tem mostrado que o Evangelho serve para lidar com qualquer
ideologia, desde que se tenha praticado a sua leitura suficientemente, como
apresentamos no capítulo III. A primeira ideologia que vem sendo o inimigo no
01 do catolicismo é o comunismo ateu. Desconhecer o comunismo ou o capitalismo
nos dias de hoje, quando se tem o jogo Ocidente x Oriente, é uma verdadeira
alienação (13, cap. III) (26, págs. 33, 34 e 35). O comunismo trata de classes,
divisão de
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classes, exploração de uma classe pela outra. A base científica
consiste numa análise econômica do capitalismo, feita por Karl Marx, no século
XIX. A igreja hoje em dia reconhece as classes e o contínuo empobrecimento da
maioria da população (26, págs. 17, 23, 26, 28), mas é contra a luta de
classes. Sempre houve um repúdio ao comunismo ateu, que empreendeu muita
perseguição aos cristãos. Mas, atualmente, face à compreensão dos episódios
históricos, essa objeção tem-se atenuado (9). Alguns cristãos progressistas
propagam o socialismo, que não seria necessariamente ateu (27, pág. 39). Quanto
à obra de Marx, ela é entendida nos meios eruditos como obra científica, e é
matéria praticamente obrigatória nos ensinamentos universitários que tem
relação com a economia. O capitalismo surgiu no século XIX e tem por doutrina o
lucro, tem suas raízes no conceito deformado de propriedade privada e no rígido
estabelecimento de salários, que são pagos em troca do trabalho muscular,
mental e neuro-muscular dos empregados (27, pág. 60) (24, pág. 13) (23, pág.
86) (26, pág. 78). No início ele atrai pela possibilidade de concorrência, boa
retribuição pela competência e dinamização de toda a economia. Na sua fase
madura ele se deturpa e desaparece a concorrência, praticamente estabelece uma
fronteira entre uma população que tem os seus proventos sempre diminuídos e
outra população que tem os rendimentos sempre aumentados (25, págs. 34 e 35). O
maior problema aparece quando se tem uma região política que atingiu a
maturidade e outra ainda em fase incipiente ou que ainda não tenha iniciado o
processo, que é o caso de dois países (3, págs. 44 e 45). Com relação às
autoridades católicas, há atualmente um equilíbrio de forças com relação às
duas tendências. De um lado, bispos e padres se unem em defesa dos oprimidos e
empobrecidos, e escrevem livros declarando ser o capitalismo um pecado. Do
outro lado, a igreja possui muitas riquezas, tendo muitas empresas
capitalistas, representadas por colégios, prédios e terrenos alugados,
livrarias, editoras, universidades, fazendas etc., cujos administradores, que
são geralmente padres, bispos ou freiras, defendem a manutenção do sistema
político e econômico. Os primeiros são chamados progressistas e os últimos
conservadores. Os progressistas são geralmente carismáticos, dotados de grande
sensibilidade e habilidade intelectual. Suas atuações são geralmente através de
livros, do aproveitamento cioso de todas as oportunidades surgidas na imprensa,
do testemunho público do Evangelho, e do uso da lógica nos locais onde lhes
permitem debater. Os conservadores são enérgicos e bons administradores. Atuam
geralmente nas entidades que dirigem, tendo por característica o recato e
precaução no trato com as pessoas. Nesse aspecto a igreja católica leva
vantagem com relação a todas as outras, pois sempre foi possível a coexistência
de várias linhas de pensamento. Basta lembrarmos de um S. Francisco de Assis em
plena Idade Média, ou de um Papa Paulo III na época escravista da América.
As
Testemunhas de Jeová, por exemplo, aprendem que o homem é incapaz de se
governar, pois somente Deus consertará o estado de desordem da sociedade, no
futuro. Cabe a eles apenas esperar. Como conseqüência eles não participam da
política, não fazem greve (03, pág. 55) e nem se aprofundam na realidade
social. As outras confissões protestantes são muito semelhantes entre si,
zelando pelo culto, pela pregação do Evangelho relativo à conversão individual.
Pode-se observar que os homens utilizam paletó e gravata como padrão de boa
aparência, o que denota a importação cultural e certamente também ideológica.
Essa semelhança se deve ao berço comum: Inglaterra e Estados Unidos, que são os
países de maior pujança capitalista. Uma outra observação importante é a
verificação freqüente na imprensa de casos de participação de sacerdotes,
bispos, e leigos católicos, na promoção da justiça, tendo sido muitos
sacrificados por suas convicções, para um índice praticamente nulo com relação
às outras confissões.
Devemos
parar um pouco com essas considerações e comentários, nessa altura do capítulo,
para passar o bastão aos presentes, na feitura do debate, que certamente virá.
Assim o esperamos ansiosamente, ajudados pelo espírito de humildade, que será o
apetrecho mais útil na ânsia mais completa da verdade.
NOTA DO AUTOR
Os
capítulos VI e VII foram reescritos tendo em vista os debates realizados na
reunião da equipe de batismo, no dia 20/02/88. Esses capítulos tomaram uma
feição mais incisiva quanto às conclusões que estavam apenas insinuadas no
texto original, tomando uma forma mais direta de exposição. Os capítulos IV e V
tiveram apenas ligeiras modificações. Os capítulos I, II e III, por terem sido
considerados muito claros e didáticos conservaram a sua forma integralmente. De
modo geral houve mais citações específicas dos textos assinalados na
bibliografia recomendada, dando maior respaldo às conclusões consideradas
inaceitáveis pelos fiéis mais conservadores, segundo opinião dos participantes
do primeiro debate. Somos gratos a todos pelas contribuições que nos sejam
enviadas para formulação de um texto mais completo, que venha inserir a prática
cristã como fulcro da caminhada atual da humanidade.
Rio de Janeiro,
14/04/1988
____________________________________
Francisco José Lins Peixoto
BIBLIOGRAFIA
1 - Tertuliano – O Sacramento do Batismo – Col. P. da I., Vozes
2 - Câmara, Helder – O evangelho com D. Helder, Civ. Brás.
3 - Papa João Paulo II – Carta enc. Laborem Exercens
4 - Col. Inic. à Teol., 1a série, Vol. 12, Bat. e
Euc., pág. 40
5 - Boff, Leonardo – Igreja, Carisma e Poder, Vozes.
6 - Artigos do periódico Sojourner, Dez/1987, págs. 12 a 28
7 - Casaldáliga, Pedro – Creio na Justiça e na Esperança, Civ. Bras.
8 - Brecht, Bertolt – Se os tubarões fossem homens.
9 - Betto, Frei – Fidel e a religião – Brasiliense.
10 - VI Plano Pastoral de Conjunto da Arquidiocese do Rio de Janeiro
11 - Joergensen, Johannes – São Francisco de Assis, Vozes.
12 - Freire, Paulo – Pedagogia do Oprimido – Paz e Terra.
13 - Câmara, Helder – O deserto é fértil – Civ. Bras.
14 - Freire, Paulo – Educação como prática da liberdade – Paz e Terra
15 - Os escritos de S. Clara – Vozes.
16 - Papa Leão XIII – Carta Enc. Rerum Novarum
17 – CNBB – Manual da Campanha da Fraternidade 1988.
18 - Papa João Paulo II – Na Terra da Cruz Verdadeira, Butzon &
Berker.
19 - Broer, Wolfgang – Minha Profissão é Papa (João Paulo II)
20 - Câmara, Helder – Fome e Sede de Justiça.
21 - Câmara, Helder – As conversões de um bispo.
22 - Fetter,
Bernadine – Somos gente, UFAL, 1973.
23 - Const.
Pastoral – Gaudium et Spes.
24 - Carta Encíclica – Populorum Progressio.
25 - Carta Encíclica – Quadragésimo Anno.
26 - Carta Encíclica – Mater et Magistra.
27 - Carta Encíclica – Pacem in Terris.
28 - Papa João Paulo II – Sollicitudo Rei Socialis, 1987.
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