domingo, 13 de agosto de 2017

CURSO PARA ANIMADORES DOS ENCONTROS DE PAIS E PADRINHOS

CURSO PARA ANIMADORES DOS ENCONTROS DE PAIS E PADRINHOS

Pastoral de batismo da Matriz de N. S. das Dores
Av. Paulo de Frontin, 500, Rio Comprido, Rio de Janeiro-RJ
  

            Introdução: O presente curso tem a finalidade de transmitir a experiência de uma equipe que se mantém atuante nos últimos oito anos, promovendo muito mais um intercâmbio com os participantes do que propriamente ensino. A apresentação das conclusões desses oito anos ininterruptos de reflexão, investigação, pesquisa e prática em mais de 70 encontros pode encurtar o caminho, ou mesmo encorajar os que desejam participar dessa tarefa de evangelização e se sentem despreparados, ou são tímidos. A seguir apresentaremos capítulos que constituirão elementos para debates entre os animadores durante o curso. Esses capítulos procuram paulatinamente descrever as condições necessárias e desejáveis para que o futuro membro da equipe de batismo realize o trabalho com eficiência e segurança.


CAPÍTULO I: CONHECIMENTOS TEÓRICOS

            Quando iniciamos o trabalho nos sentimos impotentes face ao grande número de livros, folhetos e formas de realizar o encontro. O conteúdo era sempre vasto e nós nunca conseguíamos seguir toda aquela variedade. Eram três encontros: no primeiro falava-se sobre sacramentos e sobre o Espírito Santo. O segundo sobre Jesus Cristo e o terceiro sobre o cristão no mundo de hoje. No primeiro encontro comentava-se também a cerimônia do batismo. Depois que vários membros foram substituídos por outros, o volume de informações teóricas aumentou. A quantidade de matéria aumentou ainda mais depois que participamos de vários encontros a nível de região e de arquidiocese. Hoje achamos que o Evangelho é suficiente como fonte de consulta, e como exemplo percorremos o evangelho de S. Marcos, que pode ser lido totalmente em uma semana. Exemplificaremos com os seguintes versículos: 1,21 – veio pregar e curar; 2,16 – veio salvar os pecadores e escandalizou os escribas; 3,4-6 – Cristo não aceita a indiferença às suas perguntas; 4,1-41 – Parábolas; 5,30 e 6,10 – cura e pregações; 7,18; 8,15; 8,27; 9,38; 10,5; 11,27-33 – com que autoridade fazes estas coisas? 12,1-37 – respostas aos fariseus; 13,11; 13,24.
            Exercício: Ler os outros evangelhos e procurar resumi-los como no exemplo acima. Uma sugestão para realização deste exercício é ler o texto seguindo o critério:
            a) Reconhecer os versículos que são altamente decisivos para nossa conduta nos dias de hoje. Geralmente esses trechos são irrefutáveis e claros, além de provocar grande impacto quando se consideram os nossos hábitos criados na sociedade em que vivemos. São receitas infalíveis para criação do Reino aqui na terra, ou se alguém preferir, criar condições favoráveis para que a vontade de Deus se realize no nosso ambiente, levando mais almas a alcançar o Reino.
            b) Identificar os versículos que são neutros, ou seja, não apresentam evidência de poder influenciar a nossa conduta nos dias de hoje. Esses trechos são geralmente de valor histórico e revelador dos desígnios futuros do Pai.
            c) Descobrir os versículos que são incompreensíveis ou confusos, pelo menos do ponto de vista do leitor.
            Essa leitura deve ser feita com reflexão simultânea, de modo que a mente do leitor se transporte a cada segundo, com imagens nítidas, para o ambiente onde se realiza o encontro de Pais e Padrinhos. 
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Nessas imagens ele se vê dialogando e fazendo colocações constantemente com os circunstantes. Um trabalho mais completo compreende a determinação das porcentagens de frases (palavras) que constituem os itens a) b) e c) acima, para cada evangelho, em relação ao total de palavras (linhas ou páginas) do respectivo evangelho. Esse trabalho, feito em grupo, forneceria um dado interessante: mediria a homogeneidade do grupo quanto à interpretação, ou o que também poderia ser a universalidade e perfeição dos evangelhos.
            Sendo esse estudo básico e suficiente, voltamos a afirmar, o participante do curso já pode se considerar apto para o trabalho. Mas com isso não estamos querendo dizer que, consoante a disposição e carisma de cada um, não se deva prosseguir no estudo de toda a Bíblia e de outros textos. Vamos parar por aqui para não tornar esse capítulo cansativo pelo volume de informações, correndo o risco do leitor perder a noção geral do encaminhamento do curso. Para suprir essa deficiência, daremos referências de consultas bibliográficas, sempre que for oportuno, ao longo dos outros capítulos.


CAPÍTULO II COMO INSERIR O EVANGELHO NA OCASIÃO DO ENCONTRO

Quando se tenta inadvertidamente comunicar a mensagem evangélica através de fatos concretos, que desembocam em exigências de mudança de conduta, advêm imediatamente questionamentos do tipo: viemos aqui para ouvir falar do batismo!
            Quando é que vai falar do batismo? Acho que isso não tem nada a ver!
            Em épocas de menos experiência, ficamos chocados com esse tipo de manifestação dos pais e padrinhos, sobretudo quando ocorreu pela primeira vez. Nessa primeira vez conseguimos sobrepujar a situação graças ao nosso procedimento democrático, principalmente tendo sempre em mente que é importante aprender algo dos outros irmãos. Daí facultamos a palavra para encaminhamentos contra e a favor do que se tinha colocado. O resultado foi que inúmeras pessoas defenderam o nosso ponto de vista melhor do que nós mesmos poderíamos ter feito. Como os oponentes puderam se manifestar à vontade, o clima final foi de desconcentração. Hoje em dia iniciamos por suscitar perguntas sobre o batismo: Por que batizar? O que significa batismo? A partir dessas colocações fazemos analogias com locais onde o cidadão precisa fazer uma matrícula ou inscrição para em seguida pertencer àquela organização, gozando de direitos e deveres. O batismo é uma marca que deve diferenciar a pessoa, de modo a ser percebido nos meios onde ela convive. A cerimônia em que se realiza o batismo é recheada de símbolos. Mas o símbolo deve ter uma correspondência, do contrário torna-se vazio. O que difere a pessoa após o batismo é o seu comportamento, que passa a ser o comportamento de um cristão. Então o batismo inscreve a pessoa no grupo dos filhos de Deus, serve para torná-la cristã. Nesse momento coloca-se a seguinte questão: onde podemos aprender a ser cristão? Onde se encontram os ensinamentos ou regras que devemos seguir para sermos cristãos? A essa altura sempre alguém responde que não há outra maneira senão procurar conhecer o que Deus quer que façamos aqui na terra, e a fonte é a Bíblia. Reforçamos a idéia de que devemos ser diligentes e esforçados na assimilação dos ensinamentos evangélicos com a seguinte analogia: tomemos como exemplo um aluno de educação física que freqüenta uma aula dessa especialidade. Quando ele pratica todos os exercícios necessários adquire músculos no peito e nos braços, as costas tornam-se de uma largura exorbitante em relação a cintura e quadris, o abdômen parece permanecer eternamente contraído quando comparado com o peito que estufa a camisa, a ponto de não poder abotoá-la.Quando esse rapaz caminha pela rua, mesmo com movimentos simples e trajes comuns, ninguém tem dúvida da profissão que ele abraçou. Analogamente deve ser o cristão, as suas atitudes no dia a dia, no transporte coletivo, na família, na sua opção de seguidor de Cristo. Feitas colocações desse teor, pode-se passar ao exercício de reflexão evangélica, precedida de uma apresentação introdutória da Bíblia. Nesse momento acrescenta-se que o trabalho agora visa à busca do que os pais e padrinhos devem ensinar às crianças para que elas sejam cristãs de fato, já que no momento elas não tem condição de se manifestar (1), mas que terão já recebido a marca de cristão quando estiverem fazendo uso da razão.
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CAPÍTULO III: APRESENTAÇÃO DA BÍBLIA


            Iniciamos relatando que Deus no início se comunicava diretamente com a sua criação, indicando o caminho a seguir para continuar em relação amorosa com Ele, sendo semelhante a Ele e alcançando a felicidade completa. No início não havia nem sequer a escrita, os ensinamentos eram passados de geração a geração, através da linguagem falada. Naquele tempo os adultos, e especialmente os idosos, eram figuras importantes no seio da comunidade. Os mais jovens ouviam com interesse a história de seus antepassados, transmitida por aqueles anciões, verdadeiros detentores da experiência e do saber. Com o surgimento da escrita essas informações foram transcritas para a forma que hoje conhecemos. Nesse momento pode-se dividir os participantes em grupos distintos, que dispostos em círculos proporcionam ao animador a escolha do grupo para perguntas. Isso significa a descontração para uma melhor participação, do que quando se dirigem perguntas a todos em geral, ou à pessoa individualmente. Se possível, os grupos devem ter denominações diferentes, por exemplo: depois de uma breve exposição sobre Trindade, nomeia-se o grupo das mães de grupo do Espírito Santo, o grupo dos pais de grupo do Pai e o grupo dos padrinhos e madrinhas de grupo do Filho. Deve-se tomar cuidado para que os grupos tenham aproximadamente o mesmo número de integrantes, transferindo-se, por exemplo, as madrinhas, as mães ou pais mais jovens, para o grupo do Filho, pois tem acontecido ser esse o grupo inicialmente mais reduzido. À medida que se avança na exposição da Bíblia, dirigem-se perguntas constantemente aos grupos, aproveitando-se para saber o nome das pessoas, encorajando o debate entre pessoas de grupos diferentes, estimulando o cochicho dentro do grupo para discussão da pergunta, e para obtenção da resposta mais pertinente. Essa composição de grupos tem a vantagem de proporcionar um maior entrosamento e comunicação entre pessoas, uma vez que madrinhas, mães, pais, padrinhos, e freqüentemente, amigos e parentes dos presentes, relativos a crianças diferentes, estarão sentados lado a lado, sem a intervenção do animador. Uma idéia é também escrever no quadro de giz o nome de cada pessoa que responde a uma pergunta ou demonstra uma iniciativa de participação, contribuindo para um maior incentivo à participação, e tendo a função auxiliar de arquivo momentâneo, no caso de haver um lapso de memória ao se ter que se dirigir a mesma pessoa pelo nome. No caso, nós aproveitamos esses recursos simultaneamente com colocações tais como: uma reunião de cristãos se caracteriza pela franqueza, confiança mútua, doação, descontração, de modo que sabemos quando o ambiente está atingindo o ponto ideal de trabalhabilidade. Percebe-se isso pela espontaneidade, pela alegria, pelas colocações refletidas e produtivas, pela descontração no tratamento recíproco (nós costumamos chamar os idosos pelo primeiro nome e pelo pronome você), pela naturalidade do tratamento da realidade (sem as conotações “não se deve falar mal dos outros”, sem confundir discrição com omissão, etc.).
            Certa vez uma senhora estava resmungando e com aparente mau humor. Perguntamos de que se tratava e ela respondeu que achava um absurdo uma pessoa vir para a igreja e ficar numa sala até àquela hora, e em jejum. Então respondemos que na próxima reunião iríamos providenciar um cafezinho com biscoitos, o que até hoje vem acontecendo, e que era procedente a reclamação dela. No momento, talvez dado ao nosso sincero acatamento, o ambiente na sala se tornou receptivo, inclusive da parte desta senhora. Outra vez, recentemente, uma senhora se encontrava casmurra e sem nenhuma participação, apesar da nossa insistência. Num dado momento, pedimos que ela partilhasse os motivos de sua tristeza. Ela então contou que tinha deixado um filho doente em casa. Logo depois o semblante dela se modificou devido ao alívio causado pelo acolhimento compreensivo dos presentes e do nosso pedido a Deus para olhar para o sofrimento daquela família. Esses exemplos servem para mostrar que não é possível obter 100% de participação, por estas e outras razões.
            Seguindo o roteiro perguntamos quantas partes distintas contém a Bíblia. Qual a divisão mais importante da Bíblia, que coincide com a chegada de Jesus Cristo a terra? Quanto tempo já decorreu depois disso? Quanto tempo antes disso, já se tinha notícia das alianças de Deus com os homens? Quanto tempo necessitaria uma pessoa, para ler a Bíblia, da primeira a última página? Nesse estágio muitos participantes já têm respondido que o Antigo e o Novo Testamento são partes importantes e nós informamos que levamos aproximadamente 03 meses para ler toda a Bíblia. Pedimos que todos os 

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grupos respondam de quantas páginas são constituídos o Antigo e o Novo Testamento (temos cerca de 13 Bíblias para distribuir entre os grupos). Pedimos também a todos os que têm a Bíblia na mão que mostrem os respectivos volumes de páginas correspondentes aos dois Testamentos. Qual a razão da existência do Antigo e Novo Testamento? Que disse Jesus a esse respeito? Comentamos que o homem, na sua origem, não era ainda completamente desenvolvido, e que Deus, como seu criador, sabia muito bem disso. Por isso ele acompanhava adequadamente as etapas do seu desenvolvimento, até o ponto em que se fez necessário o envio de seu próprio Filho. Esse Filho inaugurou uma nova ordem de estatutos e justificou: “Não vim alterar a lei dos profetas, mas vos dou um novo mandamento. Naquela época era assim por causa da dureza dos vossos corações...”. Perguntamos qual a principal divisão do Novo Testamento. Enfatizamos que os evangelhos são fundamentais para orientação da vida dos cristãos. O resto do Novo Testamento, a partir dos Atos dos Apóstolos, é a vida dos primeiros cristãos e da sucessão dos seguidores de Cristo, que poderia continuar até os nossos dias. Exemplificamos como seria maravilhoso, se hoje em dia, os cristãos escrevessem cartas (epístolas) aos seus irmãos em Cristo, mostrando as suas preocupações, zelando pelo anúncio do Reino, exortando-os a uma ação mais coerente e concreta, promovendo a aproximação e união de paróquias longínquas, partilhando sugestões e contribuições. O Evangelho é a parte mais importante porque dita o procedimento necessário para que se tenha parte com Cristo. É o ensino direto e objetivo do Filho durante o tempo que passou entre os homens, com essa finalidade. Fazemos a analogia de um técnico em agricultura, que visitando uma família amiga na zona rural, faz amigos também na vizinhança. Durante o tempo em que esteve ali de férias, realizou algumas plantações, técnicas de adubagem, de irrigação e drenagem, sempre em companhia desse pequeno grupo de amigos. Nada, porém escreveu sobre essas técnicas e procedimentos. Um número menor ainda de amigos, conscientes da importância daqueles ensinamentos, acompanhou muito atento a tudo que se passava, e logo depois da partida do mestre, cada um desses amigos continuou a executar aqueles procedimentos e a propagá-los, para que todos os seus descendentes e todos que deles precisassem os recebessem gratuitamente, pois reconheciam que os tinham recebido sem nenhum ônus. Chegaram finalmente à conclusão, entre eles já alguns discípulos dos amigos do mestre, que a melhor solução seria resumir em forma escrita todo o essencial, de modo que todos que quisessem usufruir dos bons resultados daqueles métodos não tivessem a menor dúvida de como proceder, assim como não tivessem necessidade de esperar até que alguém lhes aparecesse para ensinar, ou que inescrupulosos tirassem proveito do conhecimento dessas técnicas.
            Quantos são os evangelhos? Quais são os nomes das pessoas que os escreveu? Quanto tempo levaria um indivíduo para ler um evangelho? Pedimos nesse momento que abram as Bíblias e segurem-nas para o alto, prendendo entre os dedos os evangelhos, para que todos tenham uma nítida idéia da proporção entre os números de páginas dos evangelhos, do número de páginas do Antigo Testamento e do número de páginas do testamento dos primeiros cristãos. Perguntamos como são divididos didaticamente cada evangelho, assim como todos os outros livros da Bíblia. Perguntamos nesse momento se alguém sabe como são divididas as novelas apresentadas na TV, para facilitar o acompanhamento por parte dos telespectadores. Depois de alguns vai e vem todos descobrem os capítulos e versículos. Pedimos que todos se ajudem mutuamente. Principalmente aqueles que têm dificuldade com a leitura. Quantos capítulos têm o evangelho de São Marcos? E o de Mateus? Quantos versículos têm o capítulo 20 de Lucas? A essa altura já começam a acontecer coisas surpreendentes: pessoas que vinham participando, e em posição de destaque, confessam que conheciam os capítulos, mas não sabiam dos versículos, a sala se enche de animação e vitalidade, nós repetimos sempre que todos podem “colar” para obter a resposta certa. Com mais alguns poucos retoques, como sejam: o evangelho nos indica que devemos fazer a reflexão de preferência em comunidade (onde há dois ou mais reunidos em Meu nome...). Reforçamos que os evangelhos são por demais lógicos, assim quis o Criador, de modo que não pode haver cristianismo sem o encontro das pessoas. Por isso ninguém tem o direito de se recusar a participar de um encontro batismal, especialmente os que têm intensa participação eclesial, pois a sua falta irá fatalmente empobrecer de certo grau o ambiente, uma vez que ele tem o dever de doar o seu conhecimento a aqueles que procuram o batismo. Sempre denominamos a nossa reunião de “Encontro”, e não, “Palestra ou Curso”. A razão é que a palestra tende a ser entendida como alguém, que sabe, vai ensinar a uma platéia de assistentes que não sabe, enquanto que

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o encontro compreende o diálogo de pessoas que sabem coisas diferentes, mas que estão dispostas a explicitar tudo que sabem, generosa e alegremente, para que os demais usufruam deste acervo, ao mesmo tempo em que estão atentas a aprender cada vez mais (possivelmente reformular alguns dos seus conhecimentos) mediante completa reflexão do que os outros manifestaram.
            Exortamos os presentes para que se mantenham em silêncio quando um irmão estiver expondo o seu ponto de vista, e, quando falarem, procurar dizer muito com poucas palavras, ou a estarem sempre lembrados de que o tempo certamente será pouco para que todos falem abundantemente, mas que seria em última análise desejável um tempo maior para o nosso encontro. Depois de terem manipulado bastante a Bíblia, as pessoas estão aptas a fazer as consultas para a reflexão evangélica. A escolha dos capítulos pode ser feita livremente pelos grupos, no caso de não se ter uma melhor opção. No nosso caso temos deixado aos grupos a indicação do evangelho, capítulo e versículo, como experiência aleatória, alertando sempre para o que poderá ocorrer (ver capítulo1, itens a, b e c). Surpreendentemente tem ocorrido que as leituras são interessantes e se enquadram no assunto que estamos tratando, mesmo quando escolhidas por indivíduos sem prática de leitura bíblica. Encorajamos também a leitura de livros que mostram a reflexão de outros cristãos durante a leitura do evangelho (2). No final, um representante de cada grupo faz a leitura e resume as reflexões do grupo, além de ser aberta a qualquer outro componente dos grupos a palavra para comentários.


CAPÍTULO IV: INSERÇÃO DO ANIMADOR NA REALIDADE PAROQUIAL

            As condições ideais para ocorrência de um batismo em Cristo, numa paróquia típica de uma grande metrópole, ainda dependerá muito do esforço conjunto de uma significativa parcela de leigos que a freqüentam. Por isso o animador deve estar consciente de que ele está em meio a uma caminhada, o que é diferente de se já ter os paroquianos razoavelmente organizados e orientados para virem a ser uma comunidade. Podemos concluir então que esses capítulos foram escritos em função de sua utilidade no momento atual e muito menos como algo que funcionaria dentro de quaisquer outras situações, que esperamos venha a surgir em futuro próximo. Os capítulos I, II e III poderiam deixar de ter relevância, se alguns parâmetros fossem mudados, se outras situações estivessem ocorrendo dentro da realidade paroquial. Tomemos por exemplo as inscrições com preenchimento de fichas, onde geralmente constam o nome da criança, dos pais e padrinhos, endereços, credo, data do batismo, paróquia onde será realizada a cerimônia, hábitos religiosos dos pais e padrinhos etc. Apesar da maioria das informações ser prestada com honestidade, pois é comum ter-se reuniões mensais com muitas fichas demonstrando absoluta falta de conhecimentos evangélicos, não há um esforço para reparação dessa falha antes do dia do encontro. Essas inscrições são feitas normalmente por uma mesma pessoa, que funciona como secretária da paróquia e tem simultaneamente todos os outros afazeres relativos ao secretariado, ao invés de se ter uma co-responsabilidade de um número maior de elementos da comunidade, que aproveitaria essa oportunidade para ajudar aos que procuram o caminho, a verdade e a vida.
            A tradição bíblica mostra que primeiro evangeliza-se, e depois, quando o batizando refletiu suficientemente sobre os direitos, deveres e riscos que trarão a sua nova condição, inclusive já com alguma prática na vida real, ele faz a sua opção. Essa opção é reconhecida pela comunidade local, onde o batizando será inserido. O padrinho iniciou o candidato nos ensinamentos bíblicos, exercitou-o, e continuará responsável pelo seu desenvolvimento junto à comunidade. Nos parece muito lógico (como é o Evangelho, assim quis o criador) que algo muito bom precisa ser divulgado, mas não imposto sem uma justificativa convincente, muito mais ainda por tirar a oportunidade do batizando de se inscrever corretamente. Achamos que pais evangelizados, inscritos numa comunidade autêntica, jamais insistirão no batismo de suas crianças (4). Pelo contrário, aguardarão o dia em que seus filhos vierem a decidir este passo, cheios de esperança e alegria. Por esta razão se dedicaram anos a fio a mostrar o valor dessa coisa tão boa (Mt 13, 44-45), praticando tudo que estava ao alcance deles, com relação à comunidade e ao resto da sociedade. Podemos mostrar também que o batismo de crianças tem uma justificativa social, e, portanto só podendo ter sido utilizado enquanto perdurassem aquelas condições
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 sociais, que reconhecemos hoje não terem sido justas. No tempo da sociedade patriarcal batizava-se a família do patriarca porque a família não podia ter vontade própria. O pai decidia com quem a filha ia se casar ou qual das filhas iria casar primeiro, qual dos filhos iria estudar etc. Embora isso tenha ocorrido na Europa por toda a Idade Média, ainda é bem recente em muitos locais do nosso País. Por coincidência, tivemos no mesmo dia da redação dessa página, um relato de uma amiga nossa, ministra da eucaristia e zeladora do altar de uma de nossas paróquias. Um de seus bisavós, na época dono de escravos no Nordeste, era tão rigoroso que fez um escravo comer 01 litro de sal por ter achado a comida insossa. Mas não era diferente com relação a outros aspectos, pois conta-se que sua filha pressionava uma espécie de bandeja contra a barriga, por meio de amarras, para esconder uma gravidez fora do casamento, e que, na dispensa de sua casa, ela colocou o pescoço da criança em baixo da borda de um enorme tacho de ferro, sufocando-o. Tudo por temor à autoridade do pai.
            Mesmo admitindo o batismo de crianças, os mesmos argumentos são válidos para o caso dos pais e padrinhos, uma vez que eles trazem a criança sem saber o que se deve fazer para ser um cristão. Ora, como se pressupõe que a criança será orientada por eles, deveria haver uma preocupação no sentido da integração dessas pessoas na comunidade, e de sua evangelização. Se considerarmos, por exemplo, as “Testemunhas de Jeová”, em sua maioria absoluta, favelados e operários, vemos que eles visitam residências constantemente, em grupos de 02 ou 03 elementos, visando a divulgação de sua doutrina. Eles se prontificam a voltar àquelas residências para iniciar o morador no estudo da Bíblia, tantas vezes quantas forem necessárias. Todos pertencem a uma dada comunidade, onde estudam a Bíblia 03 vezes por semana. De 03 em 03 meses fazem uma prova escrita geral sobre as Escrituras Sagradas. Se compararmos à nossa paróquia, vemos que em 03 ou 04 missas dominicais podem-se reunir cerca de 1.000 pessoas. Verificando-se as reuniões de alguns grupos paroquiais, observa-se o nível econômico pela quantidade e qualidade dos automóveis ali estacionados. A opulência do templo e a área adjacente ocupada, de invejável amplidão para aquele distrito, são patrimônios de incalculável potencial de utilização para fins de evangelização. Face a essa pequena exposição, podemos considerar que aplicando-se um coeficiente de segurança de 02, contar-se-iam com 500 cristãos dispostos a se revezarem, de modo a haver sempre um grupo pronto para ajudar a um casal de pais ou padrinhos, na sua intenção de tornar uma criança um futuro seguidor de Cristo (Mt 10, 32-40). Contrastando com essa hipótese, nos oito anos de trabalho não tivemos mais do que cerca de meia dúzia de pessoas aptas a desenvolver esse tipo de trabalho. Numa conversa confidencial com uma de nossas amigas, veterana regente de coro de uma de nossas paróquias e assídua na hora da comunhão dominical, ela confessou nunca ter lido um evangelho.
            Uma parte do dízimo que individualmente devemos doar para a causa do Senhor (mais ou menos 10%, quando o Senhor tem direito a tudo quanto existe) daria para distribuir dezenas de Bíblias a cada família nos encontros batismais, inclusive transporte e lanche (Lc 9,12-13), e ainda sobraria uma fortuna para tudo o mais. Porém a falta de uma administração cristalina, participativa, transparente e democrática, impede que essa soma chegue aos locais onde se faz necessária. A hierarquia dominante prefere receber um centésimo dessa soma, sem ter que prestar contas a ninguém do que o total com a co-gestão da comunidade ((28), págs. 23, 25, 41, 46, 51, 52).
            A cerimônia do batismo em cada paróquia ocorre à revelia da comunidade. Em certas paróquias, a missa é encerrada apressadamente para que haja tempo dos assistentes saírem, de modo que os que vão assistir ao batizado das crianças entrem, em quase sua totalidade desconhecidos da comunidade e do próprio padre. Isso contraria completamente o sentido do batismo e o sentido de comunidade. Para não alongar mais esse capítulo, concluímos informando ao futuro animador, que ele deve estar perfeitamente consciente de que “vai fazer”, junto com meia dúzia de membros, em apenas um único encontro de 3 horas, tudo o que deveria ser feito por uma comunidade de 500 pessoas, crente e estudiosa, numa cadência adequada (Jo 15,12-17).
  
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CAPÍTULO VI: INSERÇÃO DO ANIMADOR NA REALIDADE ECLESIAL

            Jesus Cristo instituiu a sua igreja (Jo 21,15-17) (Lc 9, 1-6) (Mt 16, 18-19), dando poder a Pedro para liderá-la e instruindo a tantos outros discípulos sobre o que deveriam fazer. Pedro passou a ser o ponto de união da Igreja, sendo sucedido pelos papas até os nossos dias. Dessa forma percebemos o grande amor de Deus, pois sabendo que as suas criaturas eram de carne e osso, e, portanto passivas de certas limitações, cuidou para que seu rebanho tivesse um ponto visível de unidade e organização. Os sinais, que são os sacramentos, servem para demonstrar concretamente as ligações de Deus, porém não mais em sua forma encarnada, com o seu rebanho aqui na terra. Esses atributos são de exclusividade de sua Igreja, elemento de ligação entre a humanidade e o seu criador. Como os elementos a quem Cristo delegou o poder de ligar e desligar, de ter a posse da chave do céu, etc., jamais contrariaram as prescrições recomendadas pelo mestre, podemos concluir que essas pessoas eram apenas instrumentos para a realização da vontade do criador. Inclusive pode-se confirmar também esse ponto de vista pelas conseqüências a que chegaram esses seguidores: morte cruenta pela fidelidade ao Evangelho (Lc 16,17) (Mt 24,35) (Jo 21,18-19). Por essa conclusão lógica, não poderá jamais haver uma Igreja na face da terra que tenha o poder de contradizer um só versículo do Evangelho, que não propague e pratique por todos os recônditos tudo o que está escrito, que não acolha todo aquele que lhe reclamar o cumprimento da lei. Neste ponto podemos tirar uma das conclusões práticas mais importantes desse
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 estudo, a de que devemos conhecer tudo o que está escrito, decidir se vamos começar a praticar essas recomendações, para ativamente exigir a devida coerência das igrejas em nossa volta.
            Durante os primeiros três séculos de existência, a Igreja era nitidamente evangélica e, portanto coerente com a sua finalidade, mas na Idade Média enfrentou diversas dificuldades. A Idade Média corresponde à chamada época “negra” da humanidade e corresponde aproximadamente há 1.000 anos, descontando-se 500 anos da data atual e somando-se 500 anos a data do nascimento de Cristo, pois são decorridos cerca de 2.000 anos do nascimento dele. Hoje em dia, Teólogos e autoridades eclesiais declaram que a Igreja é santa e pecadora, por ser constituída por pessoas humanas, como o foi Pedro, que negou Cristo por 03 vezes. Pode-se também diferentemente afirmar que a Igreja (Mt 8,21) (Lc 11,27-28) (Lc 9,49-50; 11,23) é santa e não pecadora, partindo-se do princípio de que ela só pode ligar e desligar em consonância com o Evangelho, de modo que não deveria haver lugar para decisões sem a consulta aberta e democrática do Evangelho (Jo 5,22-23; 7,24) (Lc 12,14). Com relação a esta consulta democrática devemos esclarecer que certas autoridades eclesiais interpretam esse conceito de forma inversa; declara enfaticamente que a Igreja não é absolutamente uma instituição democrática, com a intenção de justificar decisões arbitrárias e de inibir qualquer iniciativa de exigência de prestação de contas por parte de alguma instância hierarquicamente inferior (Mt 18,15-18) (Lc 17,3). Essa atitude impede o surgimento do ambiente de amor favorável à prática do Evangelho, e curiosamente provoca o efeito inverso que o desejado pela hierarquia superior, qual seja o de tranqüilidade face ao domínio completo da situação. É tal a intranqüilidade, que enorme sofrimento é causado a essas pessoas, pois tendem a se afastar do colóquio do rebanho como mecanismo de defesa, pois não sabem como carregar um fardo tão pesado (M 11,28-30). Eles poderiam afirmar, nesse caso com plena correção, que a Igreja não é de fato, uma instituição democrática e sim, teocrática, mas por um outro motivo: numa democracia os cidadãos tudo podem dentro das regras, inclusive reformular a sua constituição, desde que aplique os procedimentos democráticos do voto, enquanto que essa mesma prerrogativa não existe na sociedade que prepara o Reino de Deus, pois ela é regida por uma constituição que é maior do que o próprio céu (25, pág. 45). Por outro lado, muitos procedimentos democráticos só viriam a favorecer o desenvolvimento das comunidades, podendo-se mostrar que eles são até mesmo evangélicos. Entre esses incluem-se a prática de assembléias, eleições de bispos, cardeais, párocos, conselhos paroquiais etc, ou seja, as que facilitam ao máximo a influência do rebanho, deste que não altere a constituição. A prova de que existe contradição nessas manifestações da hierarquia superior é que a eleição secreta entre os cardeais, para eleição do papa, é praticada e tem sido um procedimento democrático ideal para essa situação. Outro ponto importante é a restrição que se impõe às mulheres, sem que haja uma justificativa competente para excluí-las de participação na hierarquia superior.
            Achamos que essas práticas nos fariam como que induzidos a uma necessidade constante de consulta aos Evangelhos para argumentações no seio da Igreja, e quanto mais tivéssemos necessidade dessas consultas, assim como também ambiente propício a essas argumentações, mais Ele seria prática e vida. A nossa prática de 8 anos tem mostrado esses resultados, uma vez que a nossa referência tem sido os Evangelhos. Se fizermos a leitura histórica da atuação da hierarquia superior no Brasil, veremos que a prática foi exatamente a inversa, pois os padres sempre proibiram a leitura da Bíblia Sagrada aos fiéis, sob a argumentação de que poderia haver má interpretação das Escrituras Sagradas. Argumentos semelhantes existem também do ponto de vista geral como o de que muita gente dando opinião gera confusão, perda de tempo, indisciplina, impossibilidade de se chegar a uma decisão etc.
            A nossa experiência não tem levado a esse tipo de conclusão. Em outros trabalhos simultâneos, em outras paróquias, como por exemplo, o nosso trabalho de pouco mais de um ano recuperando uma biblioteca paroquial, mostra bem esse aspecto. Nesse trabalho convocamos todos os paroquianos para gerir uma biblioteca, com igual conhecimento de causa. Nas reuniões abertas houve sempre pouco comparecimento, o que mostra o oposto aos temores explicitados acima. Achamos até natural que isso ocorra, pois quando se tem todo o direito de dar opiniões têm-se também todos os deveres e responsabilidades. Apesar de não termos como pressionar, nem poder hierárquico sobre as pessoas, tivemos cerca de 30 pessoas que trabalharam naquele ano. Como resultado tivemos todos os livros encapados e catalogados em prateleiras novas, além de algumas promoções culturais. As doações em dinheiro eram rigorosamente registradas e aplicadas, com prestação de contas pública e detalhada. Os
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 detalhes em quadros no interior da biblioteca, onde constavam a quantidade de parafusos, buchas, tábuas, etc., e os locais onde tinham sido aplicados. A idéia era de se ter os principais jornais e revistas para leitura grátis na biblioteca, programação de leituras e discussões conjuntas de encíclicas pontifícias, livros e artigos de interesse, tudo decidido democraticamente. Previa-se que o encontro de cristãos seria facilitado, além do exercício da reflexão, comunicação e conscientização. Outras atividades também teriam lugar, como feira de livros e uma proposta de futura discoteca para músicas sacras. Ao se aproximar o mês de dezembro, inúmeros paroquianos tinham prometido contribuir um pouco mais com o13o salário, mas era também o mês de N. S. da Imaculada Conceição, e o padre tinha comprado uma imagem para ser paga pela comunidade. Muitos vieram se desculpar por não ter mais disponível o dinheiro que iam destinar à biblioteca. Nós respondemos que podíamos esperar, porque a biblioteca ia estar sempre ali. Construímos o primeiro quadro luminoso para exposição do primeiro livro, que seria vendido na biblioteca com a finalidade de ser lido e discutido pela comunidade. O dia da mesa redonda seria marcado antecipadamente, para que todos tivessem tempo de fazer a leitura. No dia em que estávamos prontos para afixar o quadro na parede externa da biblioteca, por onde todos passam após as missas dominicais, o padre nos abordou e disse: “Tirem isso daqui para depois não me chamarem de bruto”.
            Compreendemos naquele momento que, por mais humilde que fosse, por mais paciente, por mais resignado, não havia quem pudesse fazer alguma coisa naquele ambiente. Dias depois os livros e utensílios da biblioteca simplesmente desapareceram e surgiu em seu lugar uma mesinha com a imagem de Nossa Senhora. O nome da biblioteca foi retirado da fachada do prédio. O jornal paroquial também deixou de circular. Nesse mesmo ano as reuniões da Campanha da Fraternidade deixaram de ocorrer quando no salão paroquial, numa reunião exemplar, com todos sentados num grande círculo, houve necessidade de que perguntássemos se o dinheiro do aluguel do estacionamento, correspondente a um carro no pátio da igreja, podia se destinar á compra da tinta para o mimeógrafo que imprimia o jornal paroquial. O padre respondeu que não. Perguntamos por quê. Ele disse que haviam outras prioridades. Então perguntamos quem decidia sobre as prioridades, e ele respondeu enfaticamente: “Eu”.
            Se refletirmos um pouco sobre esses fatos reais podemos imaginar diversas hipóteses, cheias de incertezas e especulações: teria o bispo obrigado o padre a fazer isso? Teria ele sido forçado por outras circunstâncias? Quem lucrou com o ocorrido? Foi justo? Será que....? Concluímos se é justo e evangélico que uma comunidade seja tratada como uma escrava, sem poder dialogar, sem ter participação e sem saber o que realmente está acontecendo (Lc 12,2-3) (Jo 15,15). Por outro lado, se a prática fosse de decisões desse tipo ser tomadas em assembléias, levando-se em conta necessariamente que não faltassem ao padre todas as condições de sacerdote (despojamento das coisas materiais, desejo de servir, etc.), o próprio padre estaria sempre protegido de inserções indevidas na vida da comunidade, já que todos teriam inevitavelmente que tomar conhecimento das decisões (26, pág. 82)
            Uma outra experiência que ocorreu conosco, em outras circunstâncias da vida paroquial, foi a visita pastoral do bispo à nossa paróquia. Esse bispo promoveu dinâmicas de grupo entre casais de paróquias diferentes, e que eram representantes das paróquias que compunham a região em questão. Ele fez combinações de grupos, que eram modificadas cada semana, de modo que praticamente cada casal pôde conhecer um pouco da vida de todas as outras paróquias. O resultado foi assombroso, descobriu-se uma variedade imensa de procedimentos para a mesma atividade pastoral, insatisfações de todos os tipos, e que apesar da proximidade geográfica das igrejas, era inteiramente desconhecido o que se passava nas outras paróquias. Foi tal o sucesso, a freqüência e a participação, que o bispo sugeriu a formação de uma equipe inter-paroquial a nível de região, para tornar permanente esse tipo de integração. Quando ele finalmente pediu que levantassem o braço os que quisessem fazer parte, não faltaram voluntários.
            Algum tempo depois, soubemos que esse bispo tinha sido transferido para outra diocese distante 1.000 km, e apesar de termos dado endereço e telefone, nunca mais fomos contactados para integrar a equipe que serviria à região.
            Nossa paróquia teria sido certamente muito beneficiada com esse tipo de intercâmbio. Como exemplo podemos nos referir à nossa pastoral de batismo na atual paróquia. Ela realizava 03 encontros
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 de pais e padrinhos para se poder batizar uma criança. Acontece que as paróquias vizinhas realizavam apenas um encontro, além de haver paróquias que facilitavam ainda mais. Tivemos então que baixar o nível do nosso trabalho para poder concorrer com aquelas paróquias, pois se tivéssemos continuado com 03 encontros a nossa paróquia estaria batizando 01 a 02 crianças por mês, enquanto que as outras batizariam centenas.
            Uma outra experiência que nos mostrou a realidade eclesial foi a nossa participação como membros de uma equipe de pastoral de batismo a nível de vicariato. Nós éramos coordenadores de uma região, da qual fazia parte a nossa paróquia. Conseguimos realizar dois encontros entre as paróquias de nossa região e participar, durante aproximadamente 01 ano, das reuniões presididas pelo coordenador do vicariato. Essas últimas reuniões eram extremamente vazias, pois nunca viemos a conhecer o padre responsável pela pastoral, e, além do casal que presidia a reunião, havia mais uma dezena de pessoas, que seriam os casais que representavam as diversas regiões. Isso porque, além de alguns sempre faltarem, acontecia com freqüência só vir um dos cônjuges. Mas nas reuniões entre as paróquias de nossa região conseguimos algum resultado, logo neutralizado pela oposição ou indiferença de quase todos os párocos da nossa região. Mais uma vez sentimos que não havia possibilidade de motivarmos a massa de fiéis, dominada e emudecida pelos respectivos párocos, sem ambiente propício à comunicação, como tal é o ambiente nas paróquias, mesmo para tão nobre e santa tarefa. Os padres não compareceram aos dois encontros, com exceção do nosso pároco. A maioria não conseguiu sequer achar um coordenador para a pastoral na sua paróquia, e muito menos formar uma equipe. Um desses párocos, ao ser procurado para divulgação do encontro, explicou suas idéias da seguinte maneira: tomou a nossa mão, apontando para as alianças, e disse: A reunião é com padres. Para tratar desses assuntos só reunião de padres. O lugar de casal é em casa. O casal pode ajudar na paróquia, eventualmente, mas reunir para tratar de assuntos da Igreja é com os padres. Resta assinalar que esse pároco era extremamente dominador na organização das atividades da sua paróquia. Assistimos a uma palestra para pais e padrinhos, nessa paróquia, e constatamos que a equipe da pastoral de batismo era nada mais que a justaposição de pessoas que proferiam a palestra no dia em que eram incumbidas pelo coordenador. A palestra era semelhante à homilia das missas de domingo, em que a avantajada platéia (em relação à nossa paróquia) ouvia sonolenta, pois foi à noite a que presenciamos.
            Para não estender mais esse capítulo, vamos interromper aqui a narração de uma série de fatos reais, os quais nos mostram a necessidade de formação de novos hábitos, para que não seja obstado o desenvolvimento do Reino. Aliás, esses párocos não são mais do que o resultado dos hábitos desenvolvidos nos seminários, num ambiente de opressão e desamor.
            O animador poderá ver que terá pouca possibilidade de interferir na vida da paróquia, mesmo que seja em benefício da pastoral do batismo. O que explica o comportamento eclesial com relação aos dois últimos exemplos, é que é mais fácil dominar, ou agir arbitrariamente (talvez a única maneira), é quando se suprimem as informações (8).


CAPÍTULO VII: O ENCONTRO DE BATISMO E AS IDEOLOGIAS

            Apesar de não se poder abordar todo esse vasto assunto, tentaremos focalizar alguns pouquíssimos aspectos, pois evitá-lo seria imperdoável. Sua importância se refere à necessidade que tem o animador de poder se situar face a uma inesperada colocação por parte dos encontristas, sendo muito natural que as pessoas tenham as suas preocupações. Mesmo que isto não ocorra explicitamente, é de se prever que tal curiosidade permeie as mentes.
            A nossa experiência tem mostrado que o Evangelho serve para lidar com qualquer ideologia, desde que se tenha praticado a sua leitura suficientemente, como apresentamos no capítulo III. A primeira ideologia que vem sendo o inimigo no 01 do catolicismo é o comunismo ateu. Desconhecer o comunismo ou o capitalismo nos dias de hoje, quando se tem o jogo Ocidente x Oriente, é uma verdadeira alienação (13, cap. III) (26, págs. 33, 34 e 35). O comunismo trata de classes, divisão de

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 classes, exploração de uma classe pela outra. A base científica consiste numa análise econômica do capitalismo, feita por Karl Marx, no século XIX. A igreja hoje em dia reconhece as classes e o contínuo empobrecimento da maioria da população (26, págs. 17, 23, 26, 28), mas é contra a luta de classes. Sempre houve um repúdio ao comunismo ateu, que empreendeu muita perseguição aos cristãos. Mas, atualmente, face à compreensão dos episódios históricos, essa objeção tem-se atenuado (9). Alguns cristãos progressistas propagam o socialismo, que não seria necessariamente ateu (27, pág. 39). Quanto à obra de Marx, ela é entendida nos meios eruditos como obra científica, e é matéria praticamente obrigatória nos ensinamentos universitários que tem relação com a economia. O capitalismo surgiu no século XIX e tem por doutrina o lucro, tem suas raízes no conceito deformado de propriedade privada e no rígido estabelecimento de salários, que são pagos em troca do trabalho muscular, mental e neuro-muscular dos empregados (27, pág. 60) (24, pág. 13) (23, pág. 86) (26, pág. 78). No início ele atrai pela possibilidade de concorrência, boa retribuição pela competência e dinamização de toda a economia. Na sua fase madura ele se deturpa e desaparece a concorrência, praticamente estabelece uma fronteira entre uma população que tem os seus proventos sempre diminuídos e outra população que tem os rendimentos sempre aumentados (25, págs. 34 e 35). O maior problema aparece quando se tem uma região política que atingiu a maturidade e outra ainda em fase incipiente ou que ainda não tenha iniciado o processo, que é o caso de dois países (3, págs. 44 e 45). Com relação às autoridades católicas, há atualmente um equilíbrio de forças com relação às duas tendências. De um lado, bispos e padres se unem em defesa dos oprimidos e empobrecidos, e escrevem livros declarando ser o capitalismo um pecado. Do outro lado, a igreja possui muitas riquezas, tendo muitas empresas capitalistas, representadas por colégios, prédios e terrenos alugados, livrarias, editoras, universidades, fazendas etc., cujos administradores, que são geralmente padres, bispos ou freiras, defendem a manutenção do sistema político e econômico. Os primeiros são chamados progressistas e os últimos conservadores. Os progressistas são geralmente carismáticos, dotados de grande sensibilidade e habilidade intelectual. Suas atuações são geralmente através de livros, do aproveitamento cioso de todas as oportunidades surgidas na imprensa, do testemunho público do Evangelho, e do uso da lógica nos locais onde lhes permitem debater. Os conservadores são enérgicos e bons administradores. Atuam geralmente nas entidades que dirigem, tendo por característica o recato e precaução no trato com as pessoas. Nesse aspecto a igreja católica leva vantagem com relação a todas as outras, pois sempre foi possível a coexistência de várias linhas de pensamento. Basta lembrarmos de um S. Francisco de Assis em plena Idade Média, ou de um Papa Paulo III na época escravista da América.
            As Testemunhas de Jeová, por exemplo, aprendem que o homem é incapaz de se governar, pois somente Deus consertará o estado de desordem da sociedade, no futuro. Cabe a eles apenas esperar. Como conseqüência eles não participam da política, não fazem greve (03, pág. 55) e nem se aprofundam na realidade social. As outras confissões protestantes são muito semelhantes entre si, zelando pelo culto, pela pregação do Evangelho relativo à conversão individual. Pode-se observar que os homens utilizam paletó e gravata como padrão de boa aparência, o que denota a importação cultural e certamente também ideológica. Essa semelhança se deve ao berço comum: Inglaterra e Estados Unidos, que são os países de maior pujança capitalista. Uma outra observação importante é a verificação freqüente na imprensa de casos de participação de sacerdotes, bispos, e leigos católicos, na promoção da justiça, tendo sido muitos sacrificados por suas convicções, para um índice praticamente nulo com relação às outras confissões.
            Devemos parar um pouco com essas considerações e comentários, nessa altura do capítulo, para passar o bastão aos presentes, na feitura do debate, que certamente virá. Assim o esperamos ansiosamente, ajudados pelo espírito de humildade, que será o apetrecho mais útil na ânsia mais completa da verdade.
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NOTA DO AUTOR

            Os capítulos VI e VII foram reescritos tendo em vista os debates realizados na reunião da equipe de batismo, no dia 20/02/88. Esses capítulos tomaram uma feição mais incisiva quanto às conclusões que estavam apenas insinuadas no texto original, tomando uma forma mais direta de exposição. Os capítulos IV e V tiveram apenas ligeiras modificações. Os capítulos I, II e III, por terem sido considerados muito claros e didáticos conservaram a sua forma integralmente. De modo geral houve mais citações específicas dos textos assinalados na bibliografia recomendada, dando maior respaldo às conclusões consideradas inaceitáveis pelos fiéis mais conservadores, segundo opinião dos participantes do primeiro debate. Somos gratos a todos pelas contribuições que nos sejam enviadas para formulação de um texto mais completo, que venha inserir a prática cristã como fulcro da caminhada atual da humanidade.

Rio de Janeiro, 14/04/1988                          

____________________________________          
                        Francisco José Lins Peixoto                         



BIBLIOGRAFIA


1 -        Tertuliano – O Sacramento do Batismo – Col. P. da I., Vozes
2 -        Câmara, Helder – O evangelho com D. Helder, Civ. Brás.
3 -        Papa João Paulo II – Carta enc. Laborem Exercens
4 -        Col. Inic. à Teol., 1a série, Vol. 12, Bat. e Euc., pág. 40
5 -        Boff, Leonardo – Igreja, Carisma e Poder, Vozes.
6 -        Artigos do periódico Sojourner, Dez/1987, págs. 12 a 28
7 -        Casaldáliga, Pedro – Creio na Justiça e na Esperança, Civ. Bras.
8 -        Brecht, Bertolt – Se os tubarões fossem homens.
9 -        Betto, Frei – Fidel e a religião – Brasiliense.
10 -      VI Plano Pastoral de Conjunto da Arquidiocese do Rio de Janeiro
11 -      Joergensen, Johannes – São Francisco de Assis, Vozes.
12 -      Freire, Paulo – Pedagogia do Oprimido – Paz e Terra.
13 -      Câmara, Helder – O deserto é fértil – Civ. Bras.
14 -      Freire, Paulo – Educação como prática da liberdade – Paz e Terra
15 -      Os escritos de S. Clara – Vozes.
16 -      Papa Leão XIII – Carta Enc. Rerum Novarum
17 –     CNBB – Manual da Campanha da Fraternidade 1988.
18 -      Papa João Paulo II – Na Terra da Cruz Verdadeira, Butzon & Berker.
19 -      Broer, Wolfgang – Minha Profissão é Papa (João Paulo II)
20 -      Câmara, Helder – Fome e Sede de Justiça.
21 -      Câmara, Helder – As conversões de um bispo.
22 -      Fetter, Bernadine – Somos gente, UFAL, 1973.
23 -      Const. Pastoral – Gaudium et Spes.
24 -      Carta Encíclica – Populorum Progressio.
25 -      Carta Encíclica – Quadragésimo Anno.
26 -      Carta Encíclica – Mater et Magistra.
27 -      Carta Encíclica – Pacem in Terris.

28 -      Papa João Paulo II – Sollicitudo Rei Socialis, 1987.

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